05 agosto 2008

Os trintões...

A juventude de hoje, na faixa que vai até aos 20 anos, está perdida.
E está perdida porque não conhece os grandes valores que orientaram os que hoje rondam os trinta.
O grande choque, entre outros nessa conversa, foi quando lhe falei no Tom Sawyer. 'Quem?', perguntou ele.
Quem?! Ele não sabe quem é o Tom Sawyer! Meu Deus... Como é que ele consegue viver com ele mesmo? A própria música: Tu que andas sempre descalço, Tom Sawyer, junto ao rio a passear, Tom Sawyer, mil amigos deixarás, aqui e além... era para ele como o hino senegalês cantado em mandarim.
Claro que depois dessa surpresa, ocorreu-me que provavelmente ele não conhece outros ícones da juventude de outrora.
O D'Artacão, esse herói canídeo, que estava apaixonado por uma caniche; Sebastien et le Soleil, combatendo os terríveis Olmecs; Galáctica, que acalentava os sonhos dos jovens, com as suas naves triangulares; o Automan, com o seu Lamborghini que dava curvas a noventa graus; o mítico Homem da Atlântida, com o Patrick Duffy e as suas membranas no meio dos dedos; a Super Mulher, heroína que nos prendia à televisão só para a ver mudar de roupa (era às voltas, lembram-se?); o Barco do Amor, que apesar de agora reposto na Sic Radical, não é a mesma coisa. Naquela altura era actual...
E para acabar a lista, a mais clássica de todas as séries, e que marcou mais gente numa só geração: o Verão Azul.
Ora bem, quem não conhece o Verão Azul merece morrer.
Quem não chorou com a morte do velho Shanquete, não merece o ar que respira.
Quem, meu Deus, não sabe assobiar a música do genérico, não anda cá a fazer nada.
Depois há toda uma série de situações pelas quais estes jovens não passaram, o que os torna fracos: Ele nunca subiu a uma árvore! E pior, nunca caiu de uma. É um mole. Ele não viveu a sua infância a sonhar que um dia ia ser duplo de cinema. Ele não se transformava num super-herói quando brincava com os amigos. Ele não fazia guerras de cartuchos, com os canudos que roubávamos nas obras e que depois personalizávamos. Aliás, para ele é inconcebível que se vá a uma obra. Ele nunca roubou chocolates no Pingo-Doce. O Bate-pé para ele é marcar o ritmo de uma canção.
Confesso, senti-me velho... Esta juventude de hoje está a crescer à frente de um computador.
Tudo bem, por mim estão na boa, mas é que se houver uma situação de perigo real, em que tenham de fugir de algum sítio ou de alguma catástrofe, eles vão ficar à toa, à procura do comando da Playstation e a gritar pela Lara Croft.
Óbvio, nunca caíram quando eram mais novos. Nunca fizeram feridas, nunca andaram a fazer corridas de bicicleta uns contra os outros.
Hoje, se um miúdo cai, está pelo menos dois dias no hospital, a levar pontos e fazer exames a possíveis infecções, e depois está dois meses em casa fazer tratamento a uma doença que lhe descobriram por ter caído.
Doenças com nomes tipo Moleculum infanticus, que não existiam antigamente.
No meu tempo, se um gajo dava um malho muitas vezes chamado de "terno" nem via se havia sangue, e se houvesse, não era nada que um bocado de terra espalhada por cima não estancasse.
Eu hoje já nem vejo as mães virem à rua buscar os putos pelas orelhas, porque eles estavam a jogar à bola com os ténis novos.
Um gajo na altura aprendia a viver com o perigo. Havia uma hipótese real de se entrar na droga, de se engravidar uma miúda com 14 anos, de apanharmos tétano num prego enferrujado, de se ser raptado quando se apanhava boleia para ir para a praia. E sabíamos viver com isso. Não estamos cá? Não somos até a geração que possivelmente atinge objectivos maiores com menos idade? E ainda nos chamavam geração "rasca"... Nós éramos mais a geração "à rasca", isso sim. Sempre à rasca de dinheiro,sempre à rasca para passar de ano, sempre à rasca para entrar na universidade, sempre à rasca para tirar a carta, para o pai emprestar o carro.
Agora não falta nada aos putos. Eu, para ter um mísero Spectrum 48K, tive que pedir à família toda para se juntar e para servir de presente de anos e Natal, tudo junto. Hoje, ele é Playstation, PC, telemóvel, portátil, Gameboy, tudo.
Claro, pede-se a um chavalo de 14 anos para dar uma volta de bicicleta e ele pergunta onde é que se mete a moeda, ou quantos bytes de RAM tem aquela versão da bicicleta.
Com tanta protecção que se quis dar à juventude de hoje, só se conseguiu que 8 em cada dez putos sejam cromos.
Antes, só havia um cromo por turma. Era o totó de óculos, que levava porrada de todos, que não podia jogar à bola e que não tinha namoradas. É certo que depois veio a ser líder de algum partido, ou gerente de alguma empresa de computadores, mas não curtiu nada.
(Nota: Os chocolates não eram gamados no Pingo Doce... Ainda se chamava Pão de Açúcar!!!)
by Nuno Markl

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6 Comments:

Blogger João Roque said...

Este texto do Nuno Markl, poderia eu escrevê-lo, mas com substanciais diferenças, de vários anos para trás, cheios de coisas que o Nuno Markl nem sonhava que tinha havido antes de ele relembrar, e muito bem, as coisinhas que havia na sua meninice...
São os tempos e são as diferenças geracionais.
Abraço.

5/8/08 17:56  
Blogger Unknown said...

A crónica é a dizer pouco fabulosa,,,, ahahha e como me reconhecí nela...

A incapacidade de nos conformarmos intrinseca neste texto é partilhado por muitos de nós, custa muito ver as novas gerações de crescerem desta forma, não precisarem de lutar por nada, não precisarem de mostrarem boas notas para continuarem a estudar, pois hoje em dia fazem um favor aos pais se forem para a faculdade. Antigamente não era a primeira nem a segunda que conseguiamos aquilo que desejavamos ha meses,,, porque não era assim. Com 15 anos e depois de juntar todo o dinheiro possível, lembro-me de chegar a casa com a coisa que mais desejava ha muito tempo e que tinha comprado para mim: um microscópio. Ainda existe algum lado, ainda não me conseguí desfazer dele, porque custou-me muito consegui-lo e ainda o estimo.
Ainda bem que as coisas mudaram,,, mas pensava que fosse para melhor e não desta forma.
Nota: Nunca fui capaz de roubar chocolates no supermercado.

6/8/08 01:09  
Anonymous Anónimo said...

Aos jovens que se encontram perdidos, eu vendo mapas. LOL :-P

O resto é a evolução das coisas e do ser humano.

Beijos
A.António

7/8/08 22:36  
Blogger zehtoh said...

Acho que esta é uma discussão que a maioria de nós já teve, principalmente quando se junta o pessoal da faculdade que ronda todo a mesma idade... quantas vezes acabamos a cantar a música do dartacão? :)

P.S.: eu não roubei chocolates mas roubei autocolantes pra completar a minha colecção :D

8/8/08 13:23  
Blogger Kapitão Kaus said...

Isso é que eram tempos!
E fantásticos:)))

1/9/08 12:15  
Blogger Kapitão Kaus said...

Isso é que eram tempos!
E fantásticos:)))

1/9/08 12:16  

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